Descobrir a beleza, encará-la, deixar-se ir no seu enlevo, é coisa de criança em loja de brinquedos ou de adulto em revelados segredos, mas, a beleza emancipa-nos, faz de nós pessoas melhores, gente que já viu, que já chorou, que sente saudade de quem partiu, de quem, na vida, nos olhou e com sua beleza nos agraciou.
Hoje olho uma bailarina, dançando num rodopio de emoções, movimentos de sonho, quase impossíveis, para si tão fáceis, tão aparentemente fáceis, e, extasiado com tal beleza, deixo-me levar naquela graciosidade, a música, o movimento, o vôo daquele cisne.
As imagens, que antes descrevi, perspassaram o meu imaginário lembrando a graciosidade de tantos e tantos bailados que a vida me proporcionou. A vida é pródiga em bailados, uns com movimentos graciosos e arrebatadores, outros, mais frequentes, com movimentos descoordenados e toscos.
Em todos os momentos, como com todos os bailados, sempre aprendi algo, ora a beleza do belo, ora a ausência desta fazendo lembrar a sua valia, sempre retirei algo de bom do mau, sem deixar de querer aprender a ver o belo, mesmo onde ele parecia não existir.
Mas, admito que estou cansado, a luta foi sempre grande e, hoje, passada tanta beleza, vejo tanto e tanto lodo que se me tolda a visão, o raciocínio, esse vai fazendo por claro ser, mas o resto está cansado, abatido, prostrado e, apetece-me desistir de o belo ver, desiste de me extasiar, desistir de viver.
Sobra-me o perfume da manhã, o chilreio dos pardais, as pessoas, vejo-as banais, sem valores, casuais, sobrevivendo sem nada mais, apenas um dia a menos ou a mais, uma imensa mole de poucos sisos, onde se apagam as dignidades, se matam os sorrisos.
Não quero viver assim, com gente que se vende por um lugar ao Sol, por uma cama, por um lençol, gente que se diz Homem ou Mulher e, no fundo, se comporta como um(a) qualquer.
Pobres Putas, tantas vezes evocadas, que por comparação parecem vacas sagradas ao lado das sagradas que vacas são.
Perdoai-me aqueles que continuam sendo de valor, pessoas para quem a dignidade é um rigor, estou farto de ver tanto estertor, tanta vergonha apelidada de vida.